Momento de Poesia
Nem tu, ó alcoólico
Licor dos lagares,
Terás meus cantares,
Meus hinos terás.
Embora das ânforas
Vazado nas taças,
Aos outros tu faças
A boca loquaz.
Meu canto é da América,
País do tabaco
Melhor do que Baco,
Que o ópio melhor.
A Europa, Ásia e África
E a terra hoje toda
Já fuma por moda
O heróico vapor.
Até na Lapónia,
Da gente pequena,
Se fuma, e no Sena,
No Tibre e no Pó,
No Volga e Danúbio,
No Tejo e no Douro...
Que grande tesouro
Se deve ao Nicot!
Nem venha da cânfora
Cantar maravilhas
O das cigarrilhas
Famoso inventor.
Raspail é cismático,
E eu ortodoxo:
O seu paradoxo
Não me há-de ele impôr.
E os áridos lábios
Mais fumo ainda aspirem,
Que os nécios suspirem
Por beijos febris.
Não quero outros ósculos,
Não quero outra amante,
Qual mais doudejante
Que os fumos subtis?
Tornadas Vesúvios,
As bocas fumegam
De nuvens que cegam,
Vomitam legiões.
Fumar! Oh delícias!
Prazer de Nababo!
E leve o diabo
Do mundo as paixões!
Extraido do livro "Serões da Província" de Júlio Dinis