A Romeira
- Onde é que vais tão garrida,
Lenço azul, saia vermelha;
Pareces mais crescida
Ai, filha, fazes-me velha!
Mas... ainda agora eu reparo
Cordão novo e arrecadas!
Onde vais nesse preparo
E com estas madrugadas?
- Onde vou? À romaria
Da Senhora da Bonança.
Querem ver que não sabia
Que era hoje? Ai que lembrança!
- Que queres tu, rapariga,
Se toda a minha canseira
É fiar a minha estriga
Ao canto desta lareira.
Ora o Senhor vá contigo!
- Fique em paz minha madrinha.
- A casa voltes sem perigo,
Olha lá, vem à noitinha!
- Ai venho logo às trindades:
Que é que quer que eu lhe traga?
- Como me levas saudades
Tras-me saudades em paga.
- Pois trarei e até à vinda,
Adeus que há muito amanhece.
- Vai, que romeira tão linda
É que lá não aparece.
(Poesias de Julio Dinis 1857)
Suprema LuzVai coração, vai pelo mundo aléme ao ouvires uma voz por ti chamarqueda-te aí suspenso, a enxugaras lágrimas que vires no rosto de alguém. A tua mão amiga e piedosa estende-se ao recanto mais distante, onde ecoar o grito mais alucinante ou se oculte uma dor silenciosa.E se vires uma cruz por entre escombrosa ser arrastada em sangue, em prostração,renova em ti as forças, coraçãoe ajuda-a a levar sobre os teus ombros. Não tenhas medo, não, do sangue derramado por onde passares a Luz do Bem mesmo que em troca recebas o desdém, mesmo que fique tu depois sangrado.Rasga-te em caridade e carinhoe com todos reparte o teu amor,Sê como que uma benção do Senhora semear estrelas no teu caminho. Faz de ti uma fonte cristalina a refrescar a sede a toda a gente, uma brisa que afague, docemente como uma branda aragem matutina.Seja uma chama de ouro o teu sofrerseguindo Deus em seus Divinos passosAcolhe o mal do mundo em teus braçosverás que vale a pena viver. O tempo mata a ilusão mais terna e tudo é pó e cinza, vida além, Só a suprema luz - Luz do Bem só essa coração, é que é eterna. João Rodrigues
O Cair da tarde Cai a tarde,Nas planicies portuguesas E regressam do trabalho,as raparigas;Cai a tarde! Saudades e tristezas Vêm os olhos, vêm as bocas em cantigas. Cai a tarde!E desde o Minho ao Alentejo, Sobe às almas uma doce nostalgia; De um indizivel e suavissimodesejo, Vendo o Sol, o lindo Sol em agonia.Oiço ao longe os orfeónicos descantes, do bom povo das aldeias campesinas,Almas puras, almas simples mas amantes,.pelos caminhos, soltam vozes peregrinas.Cai a tarde! O Céu ao longe se arroxeiavolta a casa o povo bom, trabalhador, Sobe o fumo dos casais de cada aldeia,dentro delas, reina a paz e o amor. João Rodrigues